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O posicionamento do BACEN e da CVM sobre criptomoedas e tokens no Brasil



Por Kauê Cardoso



Com uma surpreendente valorização de mais de 1.100%, o bitcoin saiu de quase mil dólares no mês de janeiro para mais de US$ 11 mil em novembro. Diante deste cenário, as criptomoedas, o blockchain e, mais recentemente, a venda de tokens (os ICOs – Initial Coin Offerings), ganharam destaque.

Atualmente, estima-se que o valor diário de transações em bitcoins supera 6,6 bilhões de dólares, com um market cap de quase 200 bilhões de dólares, sendo que, além do bitcoin, mais de outras 900 criptomoedas já foram emitidas, somando (com o bitcoin) um market cap de mais de 338 bilhões de dólares. Quando se trata dos tokens, é apurado um valor ainda maior, apurando-se 420 emissões de tokens com um market cap de mais de 15 bilhões de dólares .

A despeito dos expressivos números que o mundo cripto já apresenta, a grande dúvida que paira sobre a cabeça dos investidores e dos empresários que desejam utilizar desse mecanismo é a segurança existente quando dinheiro do “mundo físico” é transformado em um ativo do “mundo digital”, surgindo, então, a necessidade de que o Direito e as Autoridades públicas se manifestem sobre o tema.

Nesse sentido, tanto a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) como o Banco Central do Brasil (Bacen), vieram a público no último dia 16 de novembro de 2017 para expor seu posicionamento sobre o tema.

O Bacen, como autoridade monetária, focou seu comunicado no fenômeno das criptomoedas (moedas virtuais), tal como o bitcoin, o ethereum e o litecoin, reiterando que elas não são moedas emitidas por nenhuma Nação soberana e não possuem lastro, de modo que seu valor, de acordo com o próprio Bacen, “decorre exclusivamente da confiança conferida pelos indivíduos ao seu emissor” e o investimento nesse tipo de ativo possui um iminente caráter de risco.

Um ponto importante no comunicado do Bacen é a referência às empresas que prestam os serviços de compra e guarda dos ativos digitais, conhecidas como exchanges e wallets.

Como sabido, para facilitar a compra e venda das criptomoedas, surgiram as denominadas exchanges, que funcionam de maneira muito semelhante a um balcão de bolsa de valores, fazendo a negociação e custódia (wallet) das criptomoedas. Essas entidades ganham taxas por cada transação de compra e venda de criptomoedas ou saques e depósitos, chegando a no Brasil (que ainda é um mercado relativamente pequeno) uma movimentação bilionária em suas contas bancária, a despeito de suas usuais estruturas enxutas.

Desse paradoxo --- grande movimentação de valores em pequenas estruturas --- surgem em todo o mundo tentativas de regulamentação das atividades das exchanges e wallets, como forma de garantir maior segurança aos usuários. Esse tema, aliás, não é novo e regulamentações icônicas e burocráticas, como a conhecida bitlicense, exigida no Estado de Nova Iorque a partir do ano de 2015, já foram responsáveis por desestimular e até impedir o desenvolvimento do mercado de criptomoedas em alguns lugares.

No Brasil, ainda inexiste qualquer tipo de regulamentação para a criação e desenvolvimento das exchanges e wallets, o que, entretanto, não desobriga as empresas do setor a cumprir com todas as suas obrigações legais, tal como a adoção de medidas que visem identificar e combater as práticas de lavagem de dinheiro e o cumprimento de deveres fiduciários quando da guarda dos ativos a ela confiados.

Vale pontuar que a posição do Bacen em alertar para os riscos decorrentes do investimento em criptomoedas sem, entretanto, interferir no desenvolvimento do mercado é, ao nosso ver, muito positiva. O ato de regulamentação, como instrumento do Direito para conferir maior segurança jurídica à sociedade, deve ser precedido de uma cuidadosa e prudente análise sobre sua necessidade e extensão, evitando desestimular o desenvolvimento social.

Noutro bordo, porém de maneira muito semelhante ao Bacen, a CVM, que já havia se manifestado em outubro deste ano, apresentou de forma muito didática um FAQ sobre o recente tema da venda de tokens – os ICOs.

Nesse ponto, vale ressaltar que o token, por definição do mercado, é a representação de um ativo virtual de qual natureza. No geral, entretanto, verifica-se duas categorias de tokens muito utilizadas: os utility tokens e os security tokens.

Os utility tokens são ativos virtuais que garantem ao seu detentor o consumo ou utilização de serviços ou acesso a plataformas. Dessa forma, possuem uma natureza muito semelhante à comercialização de um produto ou serviço --- e não um valor mobiliário ---, afastando a competência da CVM para regular esse nicho do setor. Por outro lado, os denominados security tokens são aqueles que possuem uma natureza próxima ao de um valor mobiliário, atraindo, então, a competência e normas da CVM para sua oferta e comercialização em mercado secundário.

Assim, de acordo com o posicionamento da CVM, ao passo que o token comercializado for caracterizado como valor mobiliário, ou seja, gere direito de participação, de parceria ou de remuneração advindos do esforço do empreendedor ou terceiros, conforme artigo 2º da Lei 6.385/1976, o emissor que desejar ofertá-lo publicamente deverá seguir as normas da CVM, seja para o registro ou a dispensa do registro da oferta pública.

A despeito do posicionamento da CVM, assim como o do Bacen, também ressaltar riscos e se abster de regulamentar de imediato um fenômeno ainda novo, entendemos que diversos questionamentos quanto à natureza (ou não) de um token como um valor mobiliário ainda podem ser levantados, assim como a autoridade da CVM pode ser questionada quando da captação de investimentos na venda de tokens ao redor de todo o mundo.

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