A vez das operações B2B

Alcançar e conquistar o consumidor, que é omni, deve ser o objetivo de toda empresa. Aquele ditado popular “manda quem pode e obedece quem tem juízo” pode ser facilmente adaptado para as atuais operações comerciais, nas quais: “manda o consumidor e obedece a empresa que tem juízo”.
O exigente e antenado consumidor quer ser atendido onde, como e quando ele quiser e se a sua empresa não pode oferecer essa experiência, com certeza sua concorrente o fará em uma velocidade alucinante, como são as atuais operações comerciais. Diante dessa realidade, alternativa não resta às empresas se não seguir as “ondas” impostas pelo mercado.
Em um passado não muito distante as empresas comerciais se dividiam em atacadistas (Business to Business – B2B) ou varejistas (Business to Consumer – B2C) e, seguindo essa divisão, escolhiam o canal de vendas por meio do qual levariam os seus produtos até o consumidor. Com o consumidor se tornando multicanal e, posteriormente, omni, as empresas passaram a empreender todos os seus esforços para oferecerem uma experiência única ao consumidor, movimento que, em um primeiro momento, teve um enfoque muito grande nas operações B2C.
Entretanto, já há algum tempo as exigências do consumidor têm movimentado também as operações B2B e demandado uma quebra de paradigmas, onde empresas tradicionalmente varejistas passam a atuar também no atacado; empresas atacadistas inovam e implantam novos canais de vendas no intuito de atender o conectado comprador B2B; e, em um movimento ainda incipiente, empresas industriais passam a atender diretamente o consumidor final.
A evolução é tamanha que já se criou uma rede social para o varejo, a Luckro, startup que, segundo reportagem da Exame, promete conectar e tornar mais eficiente as pontas da cadeia comercial. Os usuários da Luckro seriam divididos em 3 grupos:
• varejistas de qualquer tamanho e função, principalmente compradores;
• distribuidores/atacados/vendedores, exclusivos da marca ou não; e
• marcas, com suas equipes de trade marketing e comerciais.
Ainda segundo a matéria, na plataforma, os fornecedores podem incentivar diretamente os varejistas a fazer a execução das suas marcas e produtos no ponto de venda, comunicar as suas promoções e campanhas de desconto de forma direta ao varejo, que não mais precisará esperar pela passagem do vendedor.
Com toda essa dinâmica, as operações B2B estão tomando novos contornos, tudo em prol da satisfação do cliente. Mas afinal, quais os principais movimentos de mercado que tem impactado as operações B2B?
B2B Multicanal/Omnichannel
A necessidade de se oferecer mais de um canal de vendas é imposta pelo comprador, mas que pode beneficiar também os vendedores, que passam a dar maior visibilidade à marca, ganhando capilaridade e contando com mais “veículos” para fazerem seus produtos chegarem ao comprador.
Entretanto, não basta acoplar mais canais ao já existente. Vários estudos e cuidados são necessários. Dentre os principais pode-se citar: compreender o comportamento do cliente e a melhor maneira de atendê-lo, analisar estrategicamente como estruturar a operação para que um canal não canibalize o outro e, ainda, estudar questões técnicas como gestão de estoque, estratégia de marketing, logística, dentre tantos outros pontos.
Aliás, não basta ser multicanal. É preciso ser omnichannel.
Quando se diz que o consumidor é omnichannel, a primeira ideia que nos vem à mente é de uma operação B2C. Talvez por isso muitas empresas que efetuam vendas B2B se mantenham em sua zona de conforto, esquecendo que os compradores B2B são, antes de mais nada, compradores. Os clientes corporativos exigem funcionalidades que se assemelham às suas experiências de consumo pessoal e buscam cada vez mais interação com as empresas. O que isso quer dizer? Que as empresas B2B devem se preocupar tanto quanto as empresas B2C com a experiência do consumidor.
Segundo a Forbes, 59% dos compradores B2B preferem fazer pesquisas online em vez de interagir com um representante de vendas porque sentem que os representantes impulsionam suas próprias agendas de vendas em vez de realmente ouvirem o comprador e encontrarem uma solução que resolva o problema. Entretanto, em detrimento do clamor dos compradores B2B, apenas 14% das empresas B2B estariam centradas no cliente.
Pesquisa do ano de 2014, efetuada pela Forrester Consulting, na qual se entrevistou 526 empresas B2B e 930 compradores B2B, já apontava que as experiências que os compradores B2B tinham no comércio B2C estavam impulsionando-os a buscarem uma experiência completa também nas operações B2B. De acordo com a pesquisa, quase 75% dos compradores afirmaram ser importante a possibilidade de pesquisar sobre o produto em qualquer canal; 68% destacaram a importância de se acompanhar a jornada de compra em todos os canais; 73% buscam a possibilidade de comprar em uma filial e receber o produto diretamente do fornecedor; 61% acreditam que é importante que a entrega do produto seja efetuada no mesmo dia; mais de 40% espera poder reservar ou comprar online e retirar no offline (pick up point).
A Ambev é um exemplo de empresa que está claramente preocupada com a experiência de seu comprador. A empresa criou o Parceiro Ambev, descrito pela empresa como um portal de relacionamento, serviços e vendas para os clientes, que oferece uma experiência personalizada e uma ampla gama de serviços. Por meio do portal os clientes podem escolher a data de entrega do pedido, acompanhar o histórico de compras e a entrega em tempo real, solicitar 2ª via de boleto e nota fiscal. A Ambev disponibiliza, ainda, o Televendas, que segundo descrição da própria empresa, é um serviço gratuito em que o pedido depende apenas de uma ligação.
Outro exemplo de B2B omnichannel é a Brascol, atacadista de vestuário situada no Brás. Segundo o portal Diário do Comércio, a Brascol conta com loja física, e-commerce, store-in-store e vendas pelo celular, televendas e redes sociais. No e-commerce, funcionalidades não faltam para o comprador B2B, que pode entrar em contato com a empresa pelo WhatsApp, televendas (SAC), chat, e-mail ou ainda acessar o canal “dúvidas frequentes”. Outro exemplo da sintonia dos canais é o fato de a empresa permitir que a troca do produto adquirido no site seja efetuado em uma loja física, mediante a abertura de um chamado que deve ser efetuado por telefone.
Segundo o portal e-commercebrasil, em entrevista, Antônio Almeida, superintendente da Brascol, teria relatado que umas das principais preocupações da empresa é não assustar os varejistas que já são clientes há anos, mas desconfiam da tecnologia ou da eficácia do e-commerce. Ele cita estratégia adotada quando da implantação do e-commerce, ocasião em alguns compradores faziam toda a pesquisa pelo site e na hora de fechar a compra enviavam o pedido por fax. Nessas situações, ainda segundo Antônio, nas próximas compras do mesmo cliente, uma atendente ligava e orientava, pouco a pouco, a como fazer a compra pelo site.
B2C que implanta operação B2B
Segundo a Forrest Research, o mercado de e-commerce B2B tem potencial para crescer duas vezes mais que o B2C. Ainda, conforme divulgado pelo portal G1, o valor do ticket médio das vendas no e-commerce B2B é três vezes maior do que no B2C.
Esses números ajudam a explicar porque é cada vez mais comum identificar empresas consagradas no varejo estendendo a operação para o atacado.
Exemplo desse movimento é a Fast Shop, varejista por essência, implantou sua operação B2B, o Fast Shop Empresas, que se destina a atender grandes empresas por meio do televendas ou preenchimento de formulário, que aciona o contato de um consultor em até 2 horas
Outro exemplo é a Via Varejo, que lançou o VVAtacado, sua nova frente de vendas que, conforme descrito pela própria empresa, tem como missão oferecer aos médios e pequenos varejistas dos mais diversos segmentos soluções de produtos e serviços customizados. Nessa operação, a Via Varejo permite que a pessoa jurídica compre para uso e consumo ou para revenda. A compra de produtos pode ser efetuada pelo e-commerce e pelo televendas e há, ainda, uma equipe de vendas que pode ser acessada pelo próprio site.
Para o portal Newtrade, o diretor comercial Caio Catto, disse que o VVAtacado consiste em uma reformulação do braço de vendas atacadistas já existente na empresa, cujas mudanças abrangeriam novas condições de financiamento para os pequenos e médios negócios e o novo site pelo qual os pedidos e negociações podem ser feitas. Ainda segundo Caio para a reportagem, a “estratégia é atender negócios de pequeno e médio porte espalhados pelo Brasil e, com isso, aproveitar a capacidade logística que a Via Varejo já tem”.
Indústria que Atende diretamente o Consumidor
Direct to consumer (DTC) é um movimento de mercado que tem ganhado cada vez mais força. Nesse tipo de operação, o fabricante vende seus produtos diretamente para os clientes finais, encurtando a cadeia do processo de vendas e diminuindo custos.
É claro que esse não é um movimento pacífico, já que muito se questiona sobre os efeitos colaterais que essa estratégia geraria para os intermediários (varejistas e atacadistas). Entretanto, alguns exemplos de mercado têm mostrado que, agindo com sagacidade, é possível se adotar essa estratégia e, ainda, gerar valor para toda a cadeia de fornecimento.
A Cadence & Oster tem adotado a operação DTC para apresentar e agregar valor a novos produtos antes de colocá-los no mercado. Citando o Gerente de e-commerce da empresa, Israel Medeiros, o portal e-commercebrasil esclarece que as vendas virtuais já são o segundo maior faturamento da empresa. Sobre a estratégia adotada, Medeiros informa que para não conflitar com os varejistas, a marca lançou produtos inovadores no e-commerce que tiveram resultado satisfatório no digital, mas que poderiam não ser bem aceitos na gôndola da loja física. Medeiros ainda relatou que, com a maturidade do produto no digital, as pessoas começaram a recomendá-lo e ele começou a fazer sentido também nos pontos físicos. Citando outros cases de sucesso, Medeiros conclui que algumas estratégias como lançar produtos com conteúdos já prontos (e-mail marketing, campanhas etc) para toda a cadeia de parceiros e revendedores e trabalhar os produtos obsoletos no marketplace são opções interessantes porque o e-commerce seria fonte de insights, para desenvolvimento de novos produtos, branding e com isso todo o varejo também seria beneficiado.
Outro exemplo de empresa que buscou atender diretamente o consumidor foi a Mondelēz, dona de marcas como Lacta, Trident e Oreo . Segundo informações do portal e-commercenews, buscando divulgar sua marca em todos os meios de compra a empresa firmou parceria com a B2W para comercializar um produto inédito. Conforme a gerente de e-commerce da empresa teria esclarecido para a reportagem, a marca adotou “uma campanha global que é gigante e materializamos em um produto exclusivo para o e-commerce”. Isso porque “o ambiente de compra online é muito rico para inovação, por isso detectamos a oportunidade de lançar um produto exclusivo para este canal. Queremos estar onde nosso consumidor está e ele definitivamente está comprando cada vez mais nos sites de grandes parceiros marketplace”.
Outro movimento feito pela Mondelēz foi a venda de ovos de páscoa pelo online diretamente ao consumidor. Em reportagem para o Valor Econômico, Maria Clara Batalha, gerente de comércio eletrônico da marca, ressalta o que está por trás da estratégia. Segundo ela, “O consumidor vai aproveitar o tempo em que não pode ir a uma loja para fazer as encomendas online. A ideia é fazer a venda direta em ocasiões especiais, como Natal, Dias dos Namorados. No restante do ano, as marcas ficam disponíveis no varejo físico e online.”
Além dessas opções, a Mondelēz investiu no “LojaLacta”, e-commerce destinado a atender diretamente o consumidor final e que disponibiliza produtos tradicionais da marca. A empresa ainda permite que o consumidor compre pelo telefone ou pelo WhatsApp.
Indo na mesma direção, a Nestlé também estendeu sua operação para a loja online (Nestlécomercarsaudavel), que até então conta com produtos de alimentação infantil, e vende também pelo app ubereats. Segundo reportagem do portal Diário do Comércio, Rafael Biselli, diretor de operação digital da marca, teria esclarecido que “queremos aprender, testar um novo mercado. A ruptura é um risco, mas também é uma ótima oportunidade de crescimento”. Para tanto, quatro aspectos essenciais norteariam a gestão da multinacional. Seriam eles: engajamento, experiência personalizada, logística eficiente e velocidade. O engajamento seria alcançado pela combinação entre o online e o offline, canais que permitiriam a aproximação com o consumidor. A experiência personalizada seria oferecida por meio de um ecossistema unificado que conduziria à fidelidade do consumidor. Já a logística, teria que ser eficiente para entregar ao consumidor o esperado e na velocidade compatível com o novo perfil do consumidor.
Por fim, com uma estratégia um pouco diferente das citadas acima, mas não menos interessante, o GPA disponibilizou recentemente aplicativo que promete aproximar a indústria do cliente final. Segundo reportagem do Valor Econômico (de 26/05/2017), o mercado brasileiro é o primeiro em que o Grupo testa essa iniciativa. Trata-se de um app por meio do qual os fabricantes podem ofertar produtos promocionais diretamente aos consumidores, escolher a região e a cidade de país que pretende atingir para determinada promoção e buscar quais clientes compram com frequência lançamentos ou ofertas. O sistema ainda informaria o público a ser atingido pela ação, o investimento feito na oferta e a expectativa de venda com a operação. O GPA estaria disponibilizando para os fabricantes selecionados sua base de 12,5 milhões de clientes cadastrados nos programas de fidelidade do Pão de Açúcar Mais e Clube Extra. A intenção do GPA seria trazer mais tráfego para as lojas, ganhar escala e ampliar o volume vendido. O desconto dado aos clientes, de no mínimo 20%, seria bancado pela indústria, a qual, entretanto, seria beneficiada pela redução dos investimentos em mídia e em verbas publicitárias, de em média 3% sobre o valor do contrato, destinadas à ação promocionais em lojas.
Como se vê, em todos os exemplos acima, a venda direta para o consumidor foi estratégica e buscou resultados para todas as partes envolvidas, inclusive os intermediários. Isso só demonstra que, muito embora possa ser uma estratégia controversa, é possível se adotá-la e se auferir resultados positivos para todos os elos da cadeia comercial.
Autora

Andreia Moraes Silva
Sócia
Pós-Graduanda em Administração de Negócios (MBA) pela Fundação Getúlio Vargas.
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